20 septembre 2015

Além-mundo

Pensei naquilo que você ouviu ou viu, nos últimos dias. Será que pôde reconhecer uma voz familiar? Lembrar de outros tempos? De quando era criança, ou daquela época em que nos conhecemos, há não mais de quinze anos? Me pergunto onde você está neste exato momento. Pairando no ar, feito vento? Num breu, numa não-existência, uma espécie de buraco negro onde nada se sente? Você ainda é você, ou tornou-se poeira, memória ou outra coisa que eu nem conheço? Me lembro de você, como se ainda estivéssemos naquele contexto, apesar de outras coisas daquela época se apagarem aos poucos da minha mente. Me lembro de como falava comigo, da sua descrença e de um certo cinismo, que ajuda a remediar o desemparado. Mas eu admirei você, com todos os defeitos e descrenças. Porque no fundo acho que você acreditava em algo, sem saber bem no que. Talvez fosse naquilo do que cada um é capaz, apesar dos inúmeros vícios e fraquezas. De alguma maneira isso significa acreditar no próximo.
Será que mesmo quando não se acredita no metafísico, a gente pode usufruir de uma eventual transcendência? Eu, daqui de onde me encontro, jogada na banalidade da vida, espero que você ainda esteja em algum lugar. É esquisito pensar que talvez você não esteja mais em lugar nenhum... Como podemos desaparecer assim, um dia sim e outro dia nada mais? Um pedaço de unha, um pedaço de lembrança, e nada mais... Mas quando lembro daquela época, em que eu, jovenzinha, descobria um mundo além do perímetro do meu bairro, e você, já vivido, tornava-se cada vez mais incrédulo ao mesmo tempo em que se aproximava da verdadeira essência da Humanidade, é como se estivesse em algum lugar.

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