Esse é um período de
perdas. Ainda não somos tão velhos para perder os amigos para a eternidade.
Perdemos a familiaridade. Perdemos a clareza das estações, e o verdadeiro gosto
do tomate. Perdemos a surpresa de experimentar a pasta de dente de outro país.
Perdemos a autoridade parental. Perdemos a ausência de imagens. Perdemos o
contorno das definições. Perdemos a tinta da caneta, a falta de inspiração do
papel. Perdemos o bonde. Perdemos as diferenças entre gerações. Perdemos o fio
da meada, os reflexos, as reflexões. Perdemos as linhas retas dos carros
antigos. Perdemos o trema. Perdemos os detalhes das notas musicais. Perdemos a
lentidão. Perdemos a rua sem saída. Perdemos as abelhas. Perdemos a distância. Perdemos
os empregos. Perdemos a confiança. Perdemos os “ismos” e os “istas”. Perdemos o
outro. Perdemos os fatos. Perdemos a memória. Perdemos a possibilidade de ser
um perdedor.
Uma voz comenta
“perdeu porque teve! Não tivesse tido, não teria perdido”. Perdemos todos. A
perda não é possessão em suspenso. É feita de matéria oca. Perdemos muito.
Outra voz sussurra “perdemos
para dar espaço”... Mas seguindo assim, feitos de tanta perda, há garantias que
o espaço não se torne vão? E o vão não se abra num abismo? E o abismo, num
grande buraco?
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