01 février 2020

Impressões

O céu, generoso, toca a beira do mar. Pequenos pontos, esporádicos, indicam o homem com nostalgia. O barulho incessante do mar ocupa o espaço. A paisagem dá a impressão de momento, mas trata-se apenas de uma impressão. Quando eu não deitar mais nesse chão, e mais nenhum homem se manifestar no horizonte, e nenhuma impressão existir mais, o céu seguirá tocando a linha da água. O silêncio é próprio do homem, e do espaço. Na Terra preencherão a extensão ondas sonoras das ondas do mar.    

Enterrar as vontades, ímpetos, gritos, inexperiências. Tudo aquilo “inexistente” porque irreal, ainda não acontecido. Enterrar tudo num buraco bem cavado, sujando as unhas de terra fresca, preta - nem o corte trará de volta a aparência que tinham. Por certo são coisas irreais, mas não irrealizáveis, que enterro. São cadáveres recém nascidos, filhos de compromissos. E no momento do ritual apenas eu estarei presente, tentando me assegurar da profundidade da cova, da quantidade de terra sob a parte de mim, para sempre, irrealizada.   

Prefiro compartilhar minhas fraquezas. E no instante em que o faço, é como se apresentasse minha alma, sem artifícios. Tenho para mim que as qualidades hão de saltar aos olhos daqueles que se dispõem a me conhecer. E que os defeitos irromperão no momento inoportuno. Mas as fraquezas, quase transparentes, se escondem facilmente atrás das cortinas, debaixo do tapete, nos vãos das portas. Essa é a razão que me faz anunciá-las, aumentando ligeiramente o tom da voz. Com isso busco dar maior nitidez à imagem desajustada que pressinto, do belvedere interior. Contá-las aos outros é uma maneira de expor. E assim o fazendo, é como se dissesse :
- Aí está tudo. Faça o que bem entender disso.   

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