10 juillet 2023

O quadro

De dentro do ônibus, o contorno do vidro imprimia um quadro no céu. Não havia uma só nuvem. Apenas um ponto distante destoava do azul. Parecia parado, apesar de não flutuar. Se mantinha suspenso no ar à custa de algum esforço. De quando em quando batia rapidamente as asas. Depois, como se a força do movimento alimentasse um dínamo, tornava-se de novo um ponto imóvel no céu. Assim como, na água, batemos pernas e braços evitando o afogamento.

As águias agem dessa maneira quando avistam uma presa. Antes de mergulharem para alcançá-la, observam-na distantes, alto no céu o suficiente para passarem desapercebidas. Mas aquele passarinho definitivamente não era uma águia. O ônibus avançava lentamente, misturado aos outros motores. De certo não avistava presa alguma, pelo menos não dessas presas que lhe convém. E no entanto, ali se mantinha, um ponto fixo e em movimento.

Dava a impressão que o tinham cravado no céu. Não podia tomar outro rumo. Solitário, se dobrava à existência, tentando alguma estabilidade.

O que bem podia observar do alto?

Talvez uma pessoa que olhava o céu, enquadrada pela janela do ônibus, procurando por alguma instabilidade.


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